Por cinco votos a três, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve autuações que somam R$ 21 bilhões em quatro processos contra a Petrobras. O valor abrange a cobrança de PIS/Cofins e Cide Remessas ao Exterior (Cide-Rem) em casos que envolviam os contratos bipartidos. Prevaleceu o entendimento de que há artificialidade no modelo contratual e de que a estrutura seria uma forma de fugir à tributação.
O tema não era julgado pela Câmara Superior desde janeiro de 2020, quando foi decidido pelo voto de qualidade. Nesta terça-feira (14/3), a maioria acompanhou a divergência aberta pelo conselheiro Rosaldo Trevisan. O julgador citou precedentes e argumentou que a Câmara Superior tem considerado o modelo artificial, seja por voto de qualidade ou por maioria. Os processos são os 16682.722011/2017-17, 16682.720837/2014-91, 16682.723011/2015-64 e 16682.722012/2017-53.
Além disso, o julgador afirmou que o fato de a companhia ter sido habilitada no Repetro, regime especial aduaneiro, não significa anuência da administração tributária aos contratos bipartidos. Trevisan também entendeu que não se aplica ao caso da Petrobras um precedente da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do recurso especial (REsp) 1639035, que trata da possibilidade de contratos coligados.
Artificialidade
No modelo contratual bipartido, a companhia firma dois contratos simultâneos. Um deles é o contrato de afretamento (aluguel) de plataforma para a exploração de petróleo e gás com uma companhia estrangeira. O outro, de prestação de serviços, é pactuado com uma empresa do mesmo grupo econômico, mas constituída no Brasil.
Segundo o fisco, o objetivo da prática é diminuir a base tributável, direcionando a maior parte dos recursos para o contrato de afretamento, a fim de usufruir dos benefícios do Repetro, regime especial aduaneiro para atividades de pesquisa e lavra de jazidas de petróleo e gás.
Na Câmara Superior, a advogada da empresa, Micaela Dutra, sustentou que não houve artificialidade na operação, e que nenhum dos contratos foi invalidado sob a ótica do Repetro. De acordo com ela, a autuação fiscal se baseou em mera presunção e não apresentou provas.
“Todos [os contratos] foram admitidos, e o regime [Repetro] foi aplicado. Existe uma relação de coligação de contratos e de execução simultânea. Mas, se o auditor entendeu que existia uma bipartição artificial, seria preciso demonstrar que os contratos não representam a realidade. O auditor fez a autuação com base em cláusulas contratuais e por amostragem”, declarou.
Serviço único
A representante da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, procuradora Maria Concília de Aragão Bastos, afirmou que a mera habilitação no Repetro não implica a aprovação da administração tributária quanto aos efeitos dos contratos. A procuradora afirmou que a legislação do Repetro não respalda a bipartição de contratos de afretamento e serviços e que, no caso concreto, houve “evidente confusão” entre o serviço das contratadas estrangeira e nacional. Segundo ela, na prática, ambas prestavam um serviço único.
Os relatores dos quatro processos expuseram suas razões de decidir. As conselheiras Tatiana Midori Migiyama e Vanessa Marini Cecconello deram provimento ao recurso do contribuinte, afastando a cobrança. Nos casos relatados por Valcir Gassen e Erika Costa Camargos Autran, em que o recurso era da Fazenda, Gassen deu provimento, restabelecendo a exigência tributária, e Autran negou provimento, mantendo a decisão favorável ao contribuinte da turma ordinária.
Precedente
Entre os argumentos a favor do contribuinte, a conselheira Tatiana Midori Migiyama afirmou que a fiscalização invocou sem provas a existência de artificialidade e simulação no modelo contratual. A julgadora defendeu que não se pode ignorar que houve cessão de plataformas, tributando toda a operação como se fosse prestação de serviços. Disse, ainda, que não é possível imputar dolo, fraude ou simulação ao contribuinte. “Não houve comprovação de que receitas de prestação de serviços estariam sendo deslocadas para a afretadora”, argumentou.
A conselheira também citou a decisão da 3ª Turma do STJ no julgamento do REsp 1639035, em 2018, que admitiu a possibilidade contratos coligados. No entanto, ao abrir divergência, o conselheiro Rosaldo Trevisan rejeitou o precedente. O julgador argumentou que o caso tratava de contratos coligados de “swap” e abertura de crédito, não possuindo qualquer semelhança com o caso concreto. A maioria acompanhou o entendimento divergente.
Ainda sobre o tema, o colegiado julgou os processos 16682.722933/2015-54 e 16682.722934/2015-07, da Repsol Sinopec Brasil AS. O placar ficou em cinco votos a três a favor da Fazenda Nacional. Além disso, por voto de qualidade, a turma negou a devolução do caso à turma baixa para análise das alegações do contribuinte sobre arbitramento da base de cálculo do tributo.
Fonte: JOTA