Nunca uma matéria gerou tantas controvérsias como esta pertinente ao terço de férias. As jurisprudências dos tribunais superiores (STJ e STF) não se harmonizam.
O STJ firmou posição pela tese da natureza indenizatória das férias não gozadas por necessidade de serviços. Editou duas Súmulas abaixo transcritas:
Súmula 125 – O pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não está sujeito à incidência do imposto de renda.
Súmula 386 –São isentas do imposto de renda as indenizações de férias proporcionais e o respectivo adicional.
A proclamação da natureza indenizatória, por óbvio, afasta a natureza salarial das férias e do terço de férias, fato que livra, ipso facto, da incidência da contribuição previdenciária sobre tais verbas.
No âmbito do Supremo Tribunal Federal o assunto vem sendo discutido de longa data, sendo que a sua jurisprudência é bastante instável.
Começa pelo posicionamento da Corte Suprema de não conhecer das discussões da espécie por se tratar de controvérsias de natureza infraconstitucional.
Realmente, a Corte tem decidido interativamente que a questão de saber quanto à natureza jurídica de tal verba, para fins de tributação pela contribuição previdenciária ou pelo imposto de renda, insere-se no plano infraconstitucional: RE 611.505-RG, Rel. Min. Ayres Britto, Rel. p/ Ac. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 28-10-2014; ARE 745.901-RG, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 18.09.2014.
Contudo, o STF em várias oportunidades, examinou o mérito da controvérsia para firmar a tese pela intributabilidade do terço de férias, porque ele não incorpora a remuneração do empregado (RE nº 587.941- AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJede 22-11-2008; AI nº 603.537, AgR, Rel. Min. Eros Grau, DJede 30-3-2007; AI nº 712.880, AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 19-6-2009; AI nº 710.361, AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 8-5-2009.
Acontece que decorridos doze anos, esses mesmos insignes Ministros, sem que houvesse qualquer modificação legislativa em nível constitucional ou infraconstitucional, passaram a defender tese oposta.
Efetivamente, na sessão plenária virtual terminada no dia 28-8-2020 o STF, por maioria de votos, resolvendo o tema 985 da repercussão geral,firmou a tese pela constitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária sobre o montante pago a título de terço constitucional de férias gozadas, previsto no inciso VII do artigo 7º da Constituição.
Para a maioria dos integrantes da Corte Suprema dois são os fatores que fundamentam a decisão pela tributação do terço de férias gozadas: natureza remuneratória e a habitualidade da verba paga.
O Ministro Edson Fachin discordou desse posicionamento majoritário, porque embora o terço de férias seja pago com habitualidade ele não tem natureza remuneratória, a exemplo do auxílio-alimentação, porque esse ganho habitual do empregado não constitui parcela que se incorpora à remuneração deste, e também, por ele não integrar reflexos na aposentaria sendo, portanto, evidente, que esse terço de férias é alheio à qualquer natureza salarial.
Por derradeiro, insta lembrar que o tema número 985 da repercussão geral tem abrangência maior do que o que ficou decidido nesse julgamento finalizado em 28-8-2020 que se limitou ao terço de férias gozadas.
Com efeito é o seguinte o teor desse tema:
985 – Natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas, para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal.
Como se verifica, o tema 985 da repercussão geral versa sobre férias indenizadas ou gozadas.
Por essa razão, o Ministro Edson Fachin encaminhou à deliberação do Tribunal Pleno a seguinte tese jurídica pertinente ao Tema 985 da sistemática da repercussão geral:
É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias considerando o seu caráter reparatório.
Esse último posicionamento do STF acerca do terço de férias gozado, firmando a constitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária, tem reflexo imediato na área do imposto de renda.
Esperemos que o Supremo Tribunal Federal não venha modificar o seu entendimento solidificado há muito tempo acerca da não incidência do imposto de renda sobre as verbas de natureza indenizatória (RREE nºs 548.828/RS, 487.121/RS, 559.964/RS 591.140/RS).
Infelizmente a divergência entre a jurisprudência do STJ e do STF, e principalmente as frequentes alterações da jurisprudência da Corte Suprema, sem que houvesse modificação legislativa, conspira contra o princípio da segurança jurídica que repousa na previsibilidade que decorre das leis em vigor, suprimindo a justa expectativa dos contribuintes.
Por Kiyoshi Harada
Tributario.com.br