Em julho desse ano foi publicada a Solução de Consulta Cosit nº 24/2022, que trata sobre a compensação de créditos tributários federais. Na oportunidade, a Receita Federal interpretou a IN RFB 2.055/2021, artigo 69, §2º [1], e esclareceu qual a proporção de crédito original e juros incidentes sobre o crédito original a ser utilizada no momento de transmissão de cada declaração de compensação (DCOMP).
Em linhas gerais, a Receita entende que a proporção é determinada por um “fator de proporcionalidade”, que consiste na razão entre o valor do débito a ser compensado e o valor do crédito atualizado até o momento da compensação. O fator de proporcionalidade não consiste em um valor constante, isto é, varia a cada compensação, uma vez que os valores que o determinam também variam. A cada compensação o fator de proporcionalidade deverá ser aplicado ao valor do crédito original e ao valor dos juros incidentes sobre o crédito original, para encontrar o valor a ser compensado referente a cada parcela (deve ser consumido o mesmo percentual de crédito original e de juros).
A novidade trazida pela Solução de Consulta, contudo, não tem a ver com a proporção a ser utilizada no momento da compensação, mas sim com o valor do crédito original.
Até então, para casos envolvendo créditos decorrentes de decisão judicial transitada em julgado, era prática comum considerar como “valor do crédito original” o valor do crédito habilitado pela Receita Federal. O próprio programa PER/DCOMP de certa forma induz o contribuinte a proceder assim, já que permite a utilização de apenas um crédito por declaração de compensação (dispõe de apenas um campo para informar o valor do crédito a ser compensado). E, aparentemente, a Receita Federal nunca questionara essa prática. Havia, portanto, um contexto pacífico sobre o procedimento.
No entanto, como a legislação tributária permite a atualização do crédito original até o momento da compensação e o valor do crédito habilitado já é composto por uma parcela de juros, ao atualizar o valor do crédito habilitado ocorre a capitalização de juros (“juros sobre juros”). Diante disso, a Receita Federal se valeu da Solução de Consulta Cosit nº 24/2022 para renovar o procedimento, com base na afirmação de que é proibida a capitalização de juros para fins de atualização do crédito original.
O novo entendimento complica a vida do contribuinte. Mas não pelo fato de que o seu resultado é a provável redução do valor do crédito a compensar. Afinal, não é de todo errado condenar a incidência de juros sobre juros, uma vez que a Receita Federal não utiliza esse método na cobrança de débitos tributários.
A grande nova dificuldade está em como declarar. O contribuinte passa a ter que desmembrar o crédito decorrente de decisão judicial em diversos créditos menores, um para cada competência em que foi apurado indébito tributário. Assim, um pedido de habilitação passa a dar origem a não apenas um “valor do crédito original”, mas diversos. Além de tornar o controle dos créditos mais complexo, isso obriga o contribuinte a transmitir diversas declarações de compensação, já que o programa PER/DCOMP permite a utilização de apenas um crédito por declaração.
Para viabilizar a adoção do novo entendimento, a Receita Federal deveria atualizar o programa para permitir a utilização de mais de um crédito por declaração de compensação. Mas olha a “saia justa”: ao fazê-lo, será réu confesso sobre o fato de que o entendimento é uma novidade.
O que nos leva ao derradeiro ponto de atenção: a Receita questionará os contribuintes que, antes da publicação da Solução de Consulta Cosit nº 24/2022, usaram o método “antigo”?
Uma resposta positiva poderia ser um tanto quanto assustadora, principalmente se considerarmos que nos últimos anos foram compensados créditos de valores astronômicos, decorrentes de discussões judiciais relevantes em que o contribuinte saiu vitorioso.
[1] IN RFB 2.055/2021, Artigo 69. Na compensação efetuada pelo sujeito passivo, os créditos serão valorados na forma prevista no Capítulo X, e os débitos sofrerão a incidência de acréscimos legais, na forma da legislação de regência, até a data de entrega da declaração de compensação.
? 1º A compensação total ou parcial do débito será acompanhada da compensação, na mesma proporção, dos correspondentes acréscimos legais.
? 2º Se houver acréscimo de juros sobre o crédito, a compensação será efetuada com a utilização do crédito e dos juros compensatórios, na mesma proporção.
Fonte: ConJur