A legislação que trata do vale-refeição e do alimentação foi significativamente alterada. No fim de 2021, o Decreto nº 10.854 mudou as regras do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). E mais recentemente, a Medida Provisória nº 1.108/2022, convertida na Lei nº 14.442/2022, alterou a Lei do PAT (nº 6.321/1976) para, de forma objetiva, estender a maior parte das novidades do PAT para a modalidade CLT — as duas formas de concessão dos benefícios. Entenda nesse perguntas e respostas elaborado pelo advogado Caio Taniguchi, do TozziniFreire Advogados, as diferenças entre essas formas de concessão do benefício e as principais mudanças:
1 – Quais são as formas de concessão do benefício de alimentação e refeição aos trabalhadores e as suas diferenças?
O benefício pode ser concedidos de duas formas pelas empresas aos seus trabalhadores: a) Programa de Alimentação ao Trabalhador (PAT) – Lei nº 6.321/1976; e b) Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – artigo 457, parágrafo 2º, da CLT.
A principal diferença entre essas modalidades está no benefício fiscal aplicável às empresas que apuram os seus tributos com base no chamado “lucro real”. Isso porque, apesar das despesas incorridas pela empresa no âmbito do PAT e da CLT, quando comprovadamente destinadas ao custeio de alimentos e refeições, não sofrerem a incidência de encargos trabalhistas e tributos, as empresas que aderem ao PAT têm o direito de deduzir até o dobro das suas despesas na apuração do lucro real (utilizado no cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ).
2 – Quais são as novidades?
- Obrigatoriedade de que o valor do benefício seja igual para todos os trabalhadores;
- Possibilidade de que uma única instituição de pagamento faça a gestão de diversos benefícios concedidos pela empresa (alimentação e refeição, mobilidade e home office), desde que o benefício de alimentação-refeição esteja escriturado de forma segregada dos demais;
- Obrigatoriedade de que o saldo de cartão alimentação-refeição seja utilizado exclusivamente em estabelecimentos que comercializem alimentos e refeições;
- Vedação de saque ou transferência dos valores aportados no cartão alimentação-refeição;
- Em caso de rescisão do contrato de trabalho, o saldo do cartão é de titularidade do trabalhador, sem prejuízo da empresa efetuar o desconto dos valores por ocasião do pagamento das verbas rescisórias;
- Vedação da concessão de vantagens comerciais (desconto/deságio/rebate e prazo para pagamento) pelas empresas que fazem a gestão dos cartões alimentação-refeição;
- Implementação da portabilidade dos saldos (o trabalhador poderá migrar o saldo do cartão “X” para o cartão “Y”, a seu critério);
- Implementação da interoperabilidade dos cartões alimentação-refeição (os cartões deverão ser aceitos em todos os estabelecimentos que comercializam alimentos e refeições);
- Imposição de limite para a dedução das despesas na apuração do IRPJ.
3 – O que motivou essas significativas alterações?
O governo federal, por intermédio do Ministério do Trabalho, constatou que a legislação estava desatualizada e, além de não tornar o trabalhador o foco das ações, o benefício era facilmente desvirtuado (saques em dinheiro, compra de produtos distintos de alimentos e refeições).
4 – Quais são as oportunidades esperadas?
As medidas tendem a aumentar a concorrência, especialmente por conta da chegada de novos players da área da tecnologia nesse mercado.
Está na “moda” a contratação de “benefícios flexíveis”, que permite ao trabalhador escolher, dentre uma cesta de benefícios oferecidos pela empresa, aqueles que mais se amoldam às suas necessidades. Para isso, a legislação exige que os saldos de cada modalidade de benefícios tenha sua origem e utilização controlados e comprovados, sob pena de serem considerados como o pagamento de remuneração disfarçado (o que poder gerar discussões nas esferas trabalhista e fiscal).
Além disso, a proibição da concessão de vantagens comerciais às empresas que contratam o cartão alimentação-refeição está promovendo ótimos debates e ideias a respeito da possibilidade de concessão de benefícios diretamente aos trabalhadores.
5 – Quais são as dificuldades esperadas?
Algumas novidades ainda demandam uma regulamentação complementar, para que seja possível implementar o que está previsto na norma. Atualmente, os maiores debates giram em torno da portabilidade e da interoperabilidade, já que são medidas que podem onerar o sistema.
Ademais, já existem algumas ações judiciais que discutem a legalidade das alterações (especialmente a imposição de limite para a dedução das despesas na apuração do IRPJ), bem como o descumprimento da legislação por algumas empresas do mercado. Mas, como o Brasil é um país culturalmente propenso ao litígio, já era esperado.
6 – O tema ainda pode sofrer mais alterações?
Não teremos uma reviravolta na regulamentação do benefício alimentação-refeição, mas certamente haverá muito debate na edição das normas complementares para detalhar a portabilidade e a interoperabilidade.
Fonte: Valor Econômico