A Receita Federal esclareceu que subvenções para investimento (isenções ou redução de impostos) não devem ser tributadas em empresas que distribuem juros sobre capital próprio (JCP). O entendimento está na Solução de Consulta nº 11, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que, nessa situação, não equiparou essa forma de remuneração a acionistas aos dividendos obrigatórios – o que levaria à incidência de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL. Foi a primeira vez que as autoridades fiscais se manifestaram sobre esse assunto, segundo advogados.
Eles imaginavam que a Receita Federal poderia tributar os valores por equiparar juros sobre capital próprio a dividendos. O pano de fundo é uma questão contábil, que envolve a forma como esses benefícios fiscais têm que ser registrados na contabilidade das empresas. O contribuinte que fez a consulta é tributado com base no lucro real e teve direito, no período de 2014 a 2019, a “subvenção de investimento decorrente de incentivo fiscal”, em âmbito estadual, na forma de créditos presumidos de ICMS. Considerando normas tributárias e societárias, os valores do benefício foram registrados em conta chamada de “reserva especial de subvenção para investimento”.
A Lei nº 12.973, de 13 de maio de 2014, determina que as subvenções para investimentos serão tributadas caso não ocorra a restituição da reserva, ou se ela tiver destinação diversa da que está prevista na legislação – inclusive nas hipóteses de integração à base de cálculo dos dividendos obrigatórios. A dúvida da empresa surgiu porque, embora do ponto de vista da legislação do Imposto de Renda os juros sobre capital próprio sejam considerados como despesas financeiras, as normas contábeis tendem a considerá-los como natureza de dividendos, por causa da legislação societária. Nessa situação, porém, os juros sobre capital próprio não são equivalentes aos dividendos obrigatórios para fins tributários, de acordo com a Receita Federal. Por isso, a Cosit autorizou que, mesmo que a reserva especial de subvenção para investimento precise ser complementada com lucros futuros, a empresa distribua a remuneração aos acionistas sem tributá-la.
Na Solução de Consulta nº 11, editada neste mês, a Receita afirma que “o pagamento ou crédito de juros pela pessoa jurídica a seus sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, nos termos do artigo 9º da Lei nº 9.249, de 1995, não importa a aplicação do inciso III do parágrafo 2º do artigo 30 da Lei nº 12.973, de 2014 – que determina a tributação pelo IRPJ e pela CSLL das subvenções para investimento na hipótese de integração dessas subvenções à base de cálculo dos dividendos obrigatórios”.
O entendimento é importante porque as grandes empresas têm duas formas de remunerar acionistas: dividendos e juros sobre capital próprio, segundo Bruno Barbosa, sócio do Veirano Advogados. O advogado destaca que, no caso concreto, a reserva da empresa no momento da distribuição do JCP será insuficiente e depois será complementada. “Imaginávamos que a Receita adotaria um entendimento mais restritivo”, diz. Em geral, o assunto interessa especialmente à indústria, que é beneficiária de subvenções para investimento. “Muitas vezes já tivemos, no escritório, caso de empresa que tinha receio em distribuir juros sobre capital próprio se não tivesse lucro suficiente para reconstituir a reserva”, afirma Barbosa.
De acordo com Bruna Marrara, sócia da área tributária Machado Meyer, a dúvida do contribuinte se baseia em uma orientação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de que, para fins societários os juros sobre capital próprio devem ser contabilizados como dividendos obrigatórios. “É um bom desfecho para o contribuinte”, diz. Não há, acrescenta, precedentes judiciais ou administrativos sobre o tema. Para o advogado Carlos Eduardo Marino Orsolon, sócio do Demarest, a dúvida está ligada a mudanças nas regras de contabilidade brasileiras ocorridas a partir de 2007 com a adoção das normas internacionais (IFRS). “Tem horas que o tributarista não sabe se segue a lei fiscal ou se tenta compatibilizá-la com as regras contábeis, que são diferentes”, afirma o especialista.
Por Beatriz Olivon
Fonte: Valor Econômico