Por Beatriz Olivon — De Brasília
A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que a discussão sobre a vedação à chamada compensação de estimativa do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da CSLL não é constitucional nem tem interesse e efeito amplo. Dessa forma, o tema não deve ser julgado pela Corte. Como já existem precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) contrários à compensação, o entendimento do STF reduz as chances de vitória dos contribuintes.
O pedido chegou ao STF a partir de recurso da Mecanotécnica do Brasil Indústria e Comércio. A empresa apura IRPJ e CSLL através do recolhimento por meio de estimativas e antecipações mensais, comum entre empresas de grande porte.
No regime do lucro real, adotado por empresas que têm margem de lucro menor e obrigatório para setores como bancos e entidades de previdência privada, existe a opção de apurar o lucro trimestralmente e recolher os tributos “por estimativas”. Nele, a empresa pode fazer a apuração anual, mas será obrigada a recolher mensalmente os impostos, calculados sobre uma base estimada. Era o caso da Mecanotécnica.
A compensação foi afastada por previsão da Lei nº 13.670, de 2018. Com a vedação, as estimativas mensais apuradas pela empresa só poderão ser recolhidas em dinheiro.
A empresa alegou no STF que o direito à compensação decorre dos “deveres de moralidade e eficiência” que devem nortear a administração pública. Ainda segundo o contribuinte, o Estado não poderia permitir que o cidadão escolhesse um regime para depois, por questões políticas ou financeiras, restringir sensivelmente o meio pelo qual essas antecipações poderão ser recolhidas (RE 1356271).
A companhia alegou ainda que a alteração surpreendeu o contribuinte que planejou sua atividade confiando na norma que existia há mais de 22 anos. A empresa afirma que, se soubesse que haveria restrição, teria optado pela sistemática de apuração e recolhimentos trimestrais, em que as compensações ainda são autorizadas.
“Há verdadeira afronta ao princípio constitucional da isonomia, já que contribuintes sujeitas ao lucro real estarão submetidas à regimes de recolhimentos tributários diversos”, afirma no pedido, indicando se tratar de um “empréstimo compulsório” para o governo.
Existem, pelo menos, 90 recursos atualmente em tramitação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) discutindo o assunto e que poderiam ser enviados ao STF, segundo o relator do caso na Corte, ministro Luiz Fux. No voto, ele afirma que o STJ, em julgamento recente desse processo (REsp 1844258), considerou que o tema trata de matéria constitucional e não julgou o mérito.
O relator do processo no STJ, desembargador convocado Manoel Erhardt, afirmou, no voto, que embora se tenha indicado nas razões do recurso especial violação de dispositivos de lei federal, é incabível o recurso especial, pois foi proposto contra acórdão com “fundamento eminentemente constitucional”. A decisão é de outubro.
Em julgamento realizado também em outubro no STJ, o ministro Benedito Gonçalves afirmou que está em conformidade com “pacífica orientação jurisprudencial” a decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região (RS, SC e PR), que vedou a compensação dos débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do IRPJ e da CSLL. A decisão da 1ª Turma foi unânime (Resp 1929158).
Já no voto no STF, Fux afirmou que o TRF-4, ao decidir sobre o assunto, não usou base constitucional, portanto, não caberia a análise do tema pelo STF. Fux propôs devolver o processo ao STJ. A manifestação foi acompanhada pelos ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Faltam votar os ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, André Mendonça e Nunes Marques, que podem se manifestar até o dia 17 de fevereiro.
De acordo como tributarista Tiago Conde, sócio do escritório Sacha Calmon, o caso gera “enorme perplexidade na comunidade jurídica”. De acordo com o tributarista, a Corte caminha para negativa de repercussão geral de uma questão que o STJ falou que era constitucional. “Na prática, não teremos um posicionamento”, afirma.
Para a tributarista Valdirene Franhani, a matéria não está totalmente julgada pelo STJ e poderia ser analisada pela 1ª Seção – se confirmado que não há pano de fundo constitucional. Ainda segundo a advogada, a partir da vedação em 2018, as empresas deixaram de optar pelo regime por estimativa pelo risco de não poder compensar.
Fonte: Valor Econômico