Aparentemente, as demonstrações financeiras relativas ao encerramento do ano de 2021 serão publicadas em ambiente de paz sobre os créditos fiscais decorrentes de decisões do Supremo Tribunal Federal. Os auditores independentes “venceram” a batalha sobre o momento do reconhecimento contábil dessas decisões judiciais e a Receita Federal reconheceu parte dos pleitos – também judiciais – sobre o momento da tributação do indébito tributário. Cabe agora aos sócios, acionistas e quotistas, tomarem a decisão sobre o que fazer com o lucro gerado pelo reconhecimento dos créditos fiscais.
Tais créditos fiscais são reconhecidos como ativo da empresa, o que implica como contrapartida o reconhecimento de receita. Essa receita, sabemos, aumenta o resultado (quer gerando efetivamente lucro quer reduzindo prejuízo). Embora no caso de parte desses ativos fiscais não haja incidência dos tributos sobre o lucro (IRPJ/CSLL) no momento do reconhecimento – segundo a Receita Federal, a referida incidência se dará quando do primeiro pedido de compensação, se for o caso –, sua escrituração contábil será pelo valor líquido, ficando diferido os mencionados tributos.
Outros ativos fiscais são registrados na própria conta de IRPJ/CSLL, o que desde logo impede a sua tributação. De qualquer maneira, em nenhum desses casos há certeza da geração do caixa correspondente: em conclusão, as empresas verificarão um aumento do lucro, sem necessariamente caixa.
Quais as decisões possíveis para a deliberação dos sócios sobre esse lucro?
Em primeiro lugar, distribui-lo como dividendos. Essa será uma obrigatoriedade, inclusive, no caso das sociedades por ações, em razão do dividendo mínimo legalmente previsto. Nesse caso, a questão do caixa deverá ser equacionada.
Depois, o lucro pode ser utilizado para aumentar o capital social da empresa. Nessa opção, os sócios não ganham caixa, mas ganham com o aumento do custo da sua participação societária; não há desembolso de caixa, o que preserva a liquidez da empresa. Porém, caso, no futuro, os sócios queiram realizar esse valor, deverão ser cumpridas as formalidades para a redução do capital social.
Por fim, esse lucro poderá ser mantido na empresa. No caso de sociedades limitadas e sociedades por ações abertas apenas por dívida, basta a deliberação da maioria dos sócios ou da unanimidade dos acionistas, respectivamente, para que o lucro seja retido. Alternativamente, os sócios podem deliberar por constituir reserva de lucro, no entanto, as hipóteses – e, principalmente, suas razões legais – devem ser observadas.
As reservas de lucros também podem ser opção para as companhias abertas. Também nesse caso as hipóteses de reserva e sua motivação, conforme preceitua a legislação societária, devem ser respeitadas. Uma dessas reservas que parece fazer sentido é a reserva de lucros a realizar, porque a disponibilidade do resultado contábil depende de um evento alheio à administração da empresa. Ressalta-se, entretanto, que a reserva de lucros a realizar é, na verdade, uma “reserva de dividendos”, pois a sua distribuição aos sócios é automática tão logo o respectivo lucro se realize.
Por Edison Fernandes
Doutor em Direito pela PUC-SP, professor doutor da FEA-USP e da FGV Direito SP, titular da Academia Paulista de Letras Jurídicas
Fonte: Valor Econômico