Por Danilo Vital
Para a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, não se pode admitir que a única e última palavra sobre a licitude de movimentações de dinheiro atípicas seja do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão administrativo fiscalizador que atua como unidade de inteligência financeira.
Com esse entendimento, o colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo e deu provimento a recurso em mandado de segurança para permitir que, mediante decisão judicial, o Coaf encaminhe ao Ministério Público Federal informações abarcadas pelo sigilo fiscal, mesmo que o órgão financeiro tenha considerado esse compartilhamento desnecessário.
No caso, o MPF recebeu denúncia anônima feita por um dos funcionários do Banco do Brasil, sobre possíveis irregularidades envolvendo saques de altos valores em uma agência em Jacareí (SP).
O órgão acusador então recorreu ao Coaf, que confirmou a existência dessas transações no período indicado: saques de mais de R$ 100 mil feitos entre março de 2011 e março de 2012. No entanto, elas foram consideradas lícitas. Por isso, não foi preparado Relatório de Inteligência Financeira (RIF).
É por meio do RIF que, em regra, o compartilhamento de dados fiscais é feito de ofício pelo Coaf, sempre que recebe informações dos bancos e identifica suspeita de crime. A medida é lícita, como já reconheceu o Supremo Tribunal Federal. A jurisprudência brasileira se divide quando a hipótese é de solicitação de dados pelo MPF à Receita Federal.
Ao analisar o caso, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região entendeu que não caberia a quebra do sigilo financeiro porque a denúncia anônima foi feita por funcionário do banco que, nessa condição, tem o dever de guardar sigilo. Isso significa que, na hipótese, o MPF dependeria do envio de dados pelo Coaf para ter uma ideia sobre a ocorrência do crime.
Relator na 6ª Turma, o ministro Rogerio Schietti apontou que a existência do Relatório de Inteligência Financeira não é uma condição de procedibilidade para que o Ministério Público possa investigar movimentações financeiras atípicas. Nada impede que haja decisão judicial a autorizar tal compartilhamento.
"O titular da ação penal é o Ministério Público, que necessita desses dados para exercer seu juízo valorativo sobre a licitude das movimentações financeiras. Não há uma condição de procedibilidade que vincule o Parquet ao entendimento do Coaf sobre a legalidade da movimentação financeira do contribuinte. Não se pode admitir que a única e última palavra sobre movimentações financeiras atípicas seja do órgão administrativo", disse.
Segundo ele, prevalecendo a tese do TRF-3, a decisão do Coaf de não encaminhar o RIF acabaria por ser definitiva, já que o MPF não teria acesso às informações de modo direto e, com base apenas na denúncia anônima, não poderia recorrer ao Judiciário para a quebra do sigilo.
"No caso concreto, não se pode negar que saques semanais de valores expressivos em moeda corrente são lícitos, porém é possível afirmar que são também sujeitos à fiscalização não apenas do Coaf mas ainda por parte do Ministério Público. As informações sobre essas operações financeiras devem ser compartilhadas porquanto, de fato, o que ocorre é apenas uma transferência de sigilo entre os órgãos", acrescentou.
A decisão foi unânime. Votaram com o relator os ministros Antonio Saldanha Palheiro, Laurita Vaz e Sebastião Reis Júnior, e o desembargador convocado Olindo Menezes.
RMS 42.120