STF decide que lei estadual não pode instituir ITCMD sobre herança e doações no exterior

Os estados e o Distrito Federal não possuem competência legislativa para instituir a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) nas hipóteses de doações e heranças instituídas no exterior.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, firmou esse entendimento no julgamento de um recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida (Tema 825), em sessão virtual encerrada na última sexta-feira (26/2).

De acordo com a decisão, mesmo diante da omissão do legislador nacional acerca da matéria, os estados-membros não podem editar leis instituindo a cobrança com base na competência legislativa concorrente.

A Constituição de 1988 estabelece que cabe à lei complementar federal, e não a leis estaduais, regular a competência e a instituição do ITCMD quando o doador tiver domicílio ou residência no exterior ou se a pessoa falecida possuir bens, tiver sido residente ou domiciliada ou tiver seu inventário processado no exterior.

No caso dos autos, o Estado de São Paulo questionava acórdão do Tribunal de Justiça local que, ao negar apelação, negou ao governo estadual o poder de cobrar o ITCMD sobre doação testamentária instituída por cidadão italiano, domiciliado em seu país, em favor de brasileira, consistente em móvel localizado na cidade de Treviso e quantia em euros.

O TJ-SP considerou inconstitucional dispositivo da Lei estadual 10.705/2000 regulamentando a cobrança, sob o fundamento de que, inexistindo a lei complementar a que se refere o artigo 155, parágrafo 1º, inciso III, da Constituição Federal, a legislação paulista não poderia exigir o ITCMD na hipótese.

Competência concorrente

O voto do ministro Dias Toffoli, relator, pelo desprovimento do recurso, foi seguido pela maioria dos ministros. Ele esclareceu inicialmente que, como regra, no campo da competência concorrente para legislar, inclusive sobre direito tributário, o artigo 24 da Constituição Federal dispõe caber à União editar normas gerais, podendo os estados e o Distrito Federal suplementar aquelas, ou, inexistindo normas gerais, exercer a competência plena para editar tanto normas de caráter geral quanto normas específicas.

Na jurisprudência da Corte, de acordo com o relator, tal competência somente os autoriza a legislar, de maneira plena, sobre direito tributário, para atender peculiaridades. Segundo Toffoli, não podem ser invocadas a competência concorrente do artigo 24 da Constituição nem a autorização do artigo 34, parágrafo 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) para fundamentar a existência de um direito dos estados e do Distrito Federal de legislar sobre a matéria, sem a necessária da lei complementar.

Isso porque, a seu ver, devido ao elemento da extraterritorialidade, o legislador constituinte determinou ao Congresso Nacional que procedesse a um maior debate político sobre os critérios de fixação de normas gerais de competência tributária, com o intuito de evitar conflitos de competências geradores de bitributação entre os estados da Federação e entre países com os quais o Brasil possui acordos comerciais, mantendo uniforme o sistema de tributos.

A lei complementar exigida, apontou o relator, não tem o sentido único de norma geral ou de diretrizes, mas de diploma necessário à fixação nacional da exata competência dos estados, equalização de conflitos de competência.

Ficaram vencidos no mérito os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Gilmar Mendes, que acolhiam o recurso do estado de São Paulo. Para essa corrente, ante a omissão do legislador nacional em estabelecer as normas gerais pertinentes à competência para instituir o imposto nas hipóteses referidas, podem os estados-membros fazer uso de sua competência legislativa plena, sem prejuízo de que posterior edição de lei complementar nacional venha a regulamentar a matéria.

Modulação

A maioria do colegiado aderiu à proposta de modulação dos efeitos, constante do voto do relator, para que a decisão passe a produzir efeitos a contar da publicação do acórdão, ressalvando as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo momento, nas quais se discuta: a qual estado o contribuinte deve efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; e a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente.

Contudo, não foi acolhida a proposta de apelo ao Poder Legislativo para que supra a omissão e discipline a matéria por meio de lei complementar.

Tese

A tese de repercussão geral firmada foi a seguinte: “É vedado aos estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no artigo 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional”.

RE 851.108

Revista Consultor Jurídico


Galeria de Imagens
Outras Notícias
A isenção de IRRF de investidores não residentes em Fundos de Investimento em Participações
Carf pode demorar a aplicar decisão do STJ sobre stock options
SDI-1 vai julgar se há 'autonomia de vontade' em pejotização com salário elevado
Carf permite correção monetária de créditos de Cofins
Imunidade do ITBI em integralização de imóveis ao capital social
Aspectos tributários e contábeis do mútuo e do adiantamento para futuro aumento de capital
STJ nega contradição e mantém tese sobre tributação do stock option plan
STJ mantém IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre descontos do PERT
STJ: Limite de 20 salários-mínimos e a indefinição sobre a modulação de efeitos. Embargos de Divergência da Fazenda Nacional inauguram novo debate sobre a modulação do Tema 1.079 do STJ
Carf julga desfavoravelmente à empresa caso sobre recebível de máquina de cartão
Ao insistir na falácia da equivalência patrimonial, o Brasil descumpre tratados contra a dupla tributação
STJ diverge sobre propósito negocial da empresa-veículo que gera ágio interno
ICMS-Difal não compõe a base de cálculo de PIS e Cofins, define STJ
Primeira Turma afasta IR na fonte sobre simples transferência de cotas de fundo de investimento a herdeiros
É preciso reiterar: built to suit não pode ser revisado
STJ nega restituição de ICMS-ST por distribuidora de combustível
Opinião - Tema 1.348 do STF: a imunidade do ITBI na integralização de capital social
ISS compõe base de cálculo do IRPJ e da CSLL quando apurados pelo regime do lucro presumido
Fundos de investimento, responsabilidade civil e prescrição: REsp 2.139.747/SP
Receita entende que parcela do crédito presumido de ICMS deve ser tributada pelo Imposto de Renda
Estados trocam incentivos fiscais de ICMS para empresas fugirem de tributação federal