Imposto sobre herança vai mudar? Planos de previdência pagarão ITCMD? Entenda nova regra da Reforma Tributária

Projeto cuja aprovação deve ser concluída nesta quarta-feira na Câmara prevê que estados possam tributar fundos de aposentadoria privados


A Câmara dos Deputados aprovou na noite de terça-feira o texto-base da segunda etapa da regulamentação da Reforma Tributária. O texto trata das regras do comitê gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a ser arrecadado por estados e municípios, mas também prevê a cobrança pelos estados do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre recursos depositados em planos de previdência privada transmitidos a beneficiários por meio de heranças.


Foram 303 votos favoráveis e 142 contrários — eram necessários 257 votos. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PPAL), deixou os destaques (propostas de alteração do texto) para serem votados hoje. Só depois dessa etapa o projeto segue para a avaliação do Senado, onde já aguarda votação o primeiro e mais amplo projeto de regulamentação da reforma, aprovado pela Câmara em julho.


A previsão da cobrança do ITCMD tem como objetivo resolver o atual nó tributário apontado por especialistas: a maior parte dos estados brasileiros já cobram o imposto sobre planos de previdência privada — do tipo Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) ou Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) — no momento da transferência para herdeiros, mas não há uma regra uniforme para isso.


Os deputados estabeleceram que os investidores que ficarem mais de cinco anos no produto financeiro do tipo VGBL, a contar da data do aporte inicial, serão isentos do ITCMD, que é de competência estadual. Além disso, a tributação não incidirá sobre planos de natureza de seguro.


Mas há um obstáculo no radar: a votação na Câmara poderá ser afetada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que discutirá na próxima semana se o ITCMD se é possível ser cobrado tanto sobre o PGBL quanto sobre o VGBL em caso de falecimento do titular. O julgamento, que terá repercussão geral, ocorrerá no plenário virtual, entre os dias 23 e 30 de agosto.


Veja como são as regras hoje e como elas podem ficar com o novo texto:


Quais são as regras para a cobrança de ITCMD sobre previdência privada nos planos VGBL e PGBL?

As regras sobre a cobrança do ITCMD sobre os planos de previdência privada, como o VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) e o PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) variam conforme a legislação de cada estado.


Os recursos do PGBL costumam estar mais sujeitos ao ITCMD por integrar o patrimônio a ser dividido entre os herdeiros. Já os planos do tipo VGBL podem ou não ser tratados como seguro de vida porque o valor pago ao beneficiário é uma indenização similar a um seguro.


Segundo Guilherme Costa Val, coordenador tributário do escritório Ayres Ribeiro Advogados, as secretarias estaduais de Fazenda (Fisco estadual) tendem a desconsiderar a operação quando percebem que o VGBL foi utilizado de forma fraudulenta, constituindo abuso de direito, para que o patrimônio fosse transferido para terceiros. Portanto, ficando sujeito ao ITCMD.


Quais estados cobram ITCMD sobre valores acumulados em previdência privada, especificamente para VGBL e/ou PGBL?

Rodrigo Caserta, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados, diz que boa parte dos estados já cobra ITCMD sobre planos de previdência privada — do tipo VGBL e PGBL — no momento da transferência para herdeiros.


São eles: Minas Gerais, Paraná, Goiás, Ceará, Maranhão, Paraíba, Sergipe, Acre e Rio de Janeiro. Não há, porém, uma regra uniforme. O STF, inclusive, discute a constitucionalidade da cobrança em caso de falecimento do titular.


Qual é a faixa percentual de ITCMD aplicada à previdência privada?

Cada estado fixa hoje a sua própria alíquota, que pode variar de 1% a 8%. Frequentemente, segundo os advogados, o percentual gira em torno de 4% a 8%.


O projeto da Câmara, ainda, estabelece ainda que o Senado vai fixar o limite máximo de cobrança do ITCMD. Hoje alguns estados cobram 8%.


Apesar de a alíquota máxima ser de decisão dos senadores, os estados poderão definir a progressividade, ou variação, das alíquotas e quem se enquadra nas chamadas grandes fortunas. Porém, será preciso aplicar a alíquota máxima para “grandes patrimônios”, definição que será regulamentada em lei estadual.


O imposto é cobrado no momento da transmissão (falecimento do titular) ou apenas quando os valores são resgatados pelos beneficiários?

Segundo Costa Val, as estados hoje não têm esperado o valor e, se percebe a transferência, já costumam atuar. No entanto, conforme explica Carolina Pereira Rezende, advogada especialista em direito tributário do Briganti Advogados, o herdeiro é quem deve proceder com o pagamento do ITCMD, a partir da data do óbito, para conseguir ter acesso aos valores da previdência.


Carolina explica ainda que, pelo projeto de lei a ser votado na Câmara, há uma previsão de que as instituições financeiras já realizem o desconto antes de transferir os valores aos beneficiários. Mas, por ora, a responsabilidade de pagamento é do herdeiro.


Como ficariam as regras para a cobrança de ITCMD sobre previdência privada, com o texto aprovado na Câmara?

Tanto o PGBL quanto o VGBL seriam tributados pelo ITCMD e sua competência permaneceria com os estados. Mas os especialistas em direito tributário avaliam que já há um entendimento entre o que deve ser cobrado de cada um dos planos.


Carolina, advogada do Briganti Advogados, destaca que a Superintendência de Seguros Privados (Susep) já possui entendimento de que o VGBL possui caráter securitário. Portanto, é de se esperar que não seja tributado.


— O STJ já possui a jurisprudência pacífica de que não incide o imposto sobre VGBL, justamente por causa dessa natureza de seguro — diz.


Já no caso do PGBL, a advogada avalia ser difícil afastar a incidência de imposto porque já se construiu um entendimento de que esse tipo de plano privado de previdência seria aplicação financeira de longo prazo.


— Alguns deputados querem pelo menos tentar instituir que o PGBL não sofra incidências de ITCMD caso tenha sido construído há mais de cinco anos. Mas muita coisa ainda pode mudar — ela afirma.


O que o STF vai analisar?

O Supremo Tribunal Federal vai discutir na próxima semana se é possível ser cobrado tanto sobre o PGBL quanto sobre o VGBL em caso de morte do titular.


O julgamento ocorrerá no plenário virtual, entre os dias 23 e 30 de agosto. O relator é o ministro Dias Toffoli. Há dois anos, o STF decidiu que o caso deve ter repercussão geral.


O caso chegou ao STF devido a uma lei do Rio de Janeiro, que autorizava a cobrança em caso de morte do titular no PGBL e no VGBL. O Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), no entanto, considerou a cobrança sobre o VGBL inconstitucional. O entendimento foi questionado no STF.


No TJRJ, o entendimento foi de que o VGBL funciona como um seguro de pessoa. Já o estado do Rio alegou, no recurso ao STF, que se trata de um seguro por sobrevivência, e não de vida, e que por isso seria destinado ao próprio beneficiário.


— (O STF vai) Avaliar se, no momento do falecimento do titular do plano haveria ou não uma transmissão causa mortis dos valores apta a justificar a incidência do ITCMD, ou se nós estaríamos diante de valores que se configurariam recorrentes de um seguro e, consequentemente, não estariam nessa base de incidência — afirma Caroline Pomjé, professora da FGV Direito SP.


Houve mudança no ITBI?

O texto também altera a forma de cobrança do Imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI), de competência municipal. Poucos minutos antes do início da sessão de votação, o relator do projeto, deputado Mauro Benevides (PDT-CE), protocolou um novo parecer atendendo uma das principais demandas do setor imobiliário.


O deputado permitiu a cobrança do ITBI antes do registro do imóvel, desde que esse seja o desejo do contribuinte, com alíquota reduzida em pelo menos 50%. Ou seja, quem pagar na assinatura do compromisso de compra e venda terá alíquota menor. O projeto original tornava obrigatória a cobrança antecipada. Hoje, o ITBI é cobrado após a transferência ser formalizada.


O projeto também estabelece que a base de cálculo será com base numa tabela estabelecida pelos municípios, e não o valor normal de compra e venda.


O que ficou definido sobre o comitê gestor do IBS?

O texto também define como será o funcionamento do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a ser arrecadado por estados e municípios. O IBS é parte do futuro Imposto sobre Valor Agregado (IVA) criado com a Reforma Tributária, cujo braço federal é a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).


O comitê será responsável por administrar e fiscalizar o imposto de estados e municípios — uma espécie de Receita Federal de entes subnacionais. O texto cria um processo administrativo sobre a cobrança do imposto, uma espécie de novo Carf (que funciona como um tribunal da Receita), formado por três instâncias de decisão.


Contribuintes poderão participar da última instância de decisão do Comitê Gestor e nas demais etapas do processo administrativo.


A diretoria de fiscalização do Comitê Gestor vai fazer uma coordenação para evitar que auditores de entes diferentes cobrem o mesmo tributo, mas a informação será compartilhada com os demais estados e municípios. Pela proposta, as diretorias do comitê terão pelo menos 30% de mulheres.


Fonte: O Globo 

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